TRADE DRESS OU “CONJUNTO IMAGEM”

I – INTRODUÇÃO

Em um modelo capitalista altamente competitivo como o que temos hoje globalmente, o desenvolvimento e sucesso das empresas está intimamente ligado com a capacidade de se destacar no mercado, de ser visto e escolhido dentre todas as opções oferecidas aos consumidores. Por conta disso, as empresas trabalham fortemente em projetos e campanhas publicitárias, com o objetivo de se estabelecer identificações visuais com o público em geral.

Neste contexto, os signos distintivos exercem um papel fundamental na atividade empresária e na economia, justamente porque são o elo de comunicação final entre o produtor e o consumidor, possibilitando a identificação e diferenciação entre as empresas e o reconhecimento da origem de um produto ou serviço.

Dentre os signos distintivos de uma empresa, temos o trade dress, instituto com origem na jurisprudência americana, traduzido pela doutrina pátria como “conjunto imagem”. Em que pese não possuir previsão legal específica no ordenamento jurídico brasileiro, muitas vezes representa uma potencial fonte de lucros e constitui importantíssimo elemento do negócio, motivo pelo qual merece e pode ser juridicamente protegido.

II – CONCEITO E CRITÉRIOS PARA PROTEÇÃO

O trade dress consiste na imagem total do negócio; é o meio pelo qual o produto ou serviço é apresentado no mercado, é o “ver e o sentir” do negócio.1

Com maiores detalhes, podemos afirmar que o trade dress consiste na identidade visual de determinado produto, serviço ou estabelecimento, isto é, no conjunto de suas características particulares e essenciais, desenvolvido para lhe diferenciar perante a concorrência e auxiliar a sua identificação pelo consumidor que o procura, evitando escolhas involuntariamente equivocadas. Tais características incluem formas de apresentação ou disposição de conteúdo, embalagens, texturas, gráficos, desenhos, cor ou combinação de cores e, ainda, elementos peculiares de um estabelecimento empresarial, tais como projeto arquitetônico, estilo de decoração, aparência externa e interna, uniformes dos funcionários e, até mesmo, padrão de odorização do ambiente.

Normalmente, o trade dress reúne características tão singulares que o público-consumidor consegue identificar, imediatamente, a qual produto ou estabelecimento o mesmo se refere, o que ocorre, por exemplo, quando entramos em qualquer loja da franquia McDonald’s, Outback ou da Livraria Saraiva. A disposição dos móveis, elementos de decoração, cores, bem como a própria configuração operacional da loja não deixam dúvidas de qual estabelecimento se trata.

Para que o conjunto imagem adquira tal importância e possa ser protegido contra imitações indevidas, é necessário o preenchimento de alguns requisitos2, quais sejam:

a) Distintividade: o trade dress deve possuir a capacidade de identificar e diferenciar o estabelecimento comercial/produto/serviço da empresa daqueles já existentes no mercado, sendo que esta distintividade pode ser originária (quando o conjunto imagem possuir uma originalidade inerente, ou seja, quando ele é suficientemente diferente dos demais conjuntos imagens dos concorrentes e/ou não utiliza nenhuma característica comum no segmento) ou secundária (adquirida com o tempo, quando o público passa a identificá-lo e reconhecê-lo independente da sua falta de originalidade.);
b) Não funcionalidade: as características do conjunto imagem não podem ser simplesmente úteis ou essenciais ao uso ou à finalidade do produto; e
c) A semelhança entre os conjuntos imagens deve ser capaz de causar confusão, associação ou conexão entre as empresas, o que deve ser analisado de forma conjunta, e não elemento a elemento, além de que deve ser considerado o baixo nível de atenção do público quando adquire seus produtos e serviços, lembrando que o consumidor guarda em sua memória apenas alguns traços característicos dos produtos, motivo pelo qual a análise deve se pautar nas semelhanças entre eles, e não nas diferenças individualmente consideradas, conforme já decidido pelos tribunais3.

III – FORMAS DE PROTEÇÃO

Considerando que o trade dress não possui previsão específica no ordenamento jurídico brasileiro, necessário verificar como será feita a sua proteção, caso outras empresas indevidamente o imitem, a fim de se aproveitar do sucesso alheio.

Primeiramente, a proteção decorre da Constituição Federal, que no artigo 5º, inciso XXIX4, garante a proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, sendo que o trade dress pode ser perfeitamente enquadrado nesta última categoria.
Já no que diz respeito à proteção com base na legislação infraconstitucional, há o amparo em duas vertentes: pelas regras de repressão à concorrência desleal e pela proteção aos institutos de propriedade intelectual: marca, desenho industrial e direitos autorais.

Importante esclarecer, conforme vem sendo decidido pelos tribunais5, que estas diferentes proteções não se excluem, mas sim se compatibilizam. Logo, a violação do trade dress do produto de um competidor configura concorrência desleal, ainda que seus elementos característicos estejam separadamente protegidos por direitos de propriedade intelectual.

A respeito da proteção com base no direito autoral, é possível utilizá-la quando a criação for artística e original, o que se aplicará às obras e projetos arquitetônicos (como as fachadas de edifícios, interiores de lojas ou layouts de restaurantes), websites, assim como gravuras e desenhos aplicados a determinados produtos ou serviços.

Já nas hipóteses em que o trade dress consistir na forma plástica ornamental de um objeto, sua proteção também poderá se dar pelo registro de desenho industrial. No mais, a proteção poderá se dar também via direito marcário, através do registro perante o INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial) da marca mista ou tridimensional.

O fato é que caso o trade dress atenda às peculiaridades dos institutos de propriedade intelectual, sua proteção tende a ser mais célere e eficaz, justamente porque os próprios dispositivos legais específicos trazem uma maior segurança jurídica, o que aumenta as chances de os juízes julgarem a favor do titular do trade dress violado.

Porém, independente da proteção concedida por conta destes direitos exclusivos, a repressão à concorrência desleal é o principal mecanismo de combate à reprodução indevida do trade dress, independentemente de registro ou de qualquer outra formalidade6.

A concorrência desleal pode ser detalhada como a prática de atos que sejam contrários às condutas usualmente observadas no âmbito das relações concorrenciais, ou seja, atos praticados com excesso dos limites da liberdade de concorrência que é garantida ao agente econômico, e que possam ocasionar danos aos negócios de outrem.

Logo, todo ato daquele que, sem esforço próprio, apropria-se ou se aproveita da fama de um competidor, está sujeito a ser enquadrado como uma prática de concorrência desleal7, visto que muitos artigos têm um aspecto particular e se fixam instintivamente na memória dos consumidores as mais importantes dessas características, sendo que pela simples visualização o produto será adquirido.

Neste aspecto, a proteção ao trade dress poderá ser fundamentada no tipo penal aberto trazido pelo artigo 195, inciso III, da Lei de Propriedade Industrial8, o qual estabelece que:

Art. 195 – Comete crime de concorrência desleal quem:
(…)
III – emprega meio fraudulento para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem.

Importante ressaltar que para caracterização da fraude, não será necessária a cópia exata e fiel, bastando apenas e tão somente a imitação apta a confundir.9

Logo, de maneira objetiva e resumida, podemos descrever que o “desvio de clientela por meio fraudulento” no campo do trade dress, ocorre da seguinte forma: há um conjunto imagem com suficiente distintividade e reconhecido pelo público; e um terceiro, concorrente do titular, reproduz ou imita o trade dress original de forma tal que o consumidor, já acostumado com a existência do trade dress original, ao verificar a existência de outro conjunto imagem idêntico ou semelhante, será induzido à confusão ou fará uma associação indevida entre os produtos/serviços.

IV – CONCLUSÃO

A repressão à concorrência desleal é o fundamento mais comumente empregado pelos titulares de conjuntos imagens nas demandas judiciais envolvendo violação do trade dress; e como em muitas delas as decisões são favoráveis, concluímos que mesmo sem previsão específica no ordenamento jurídico, os prejuízos sofridos pelo titular do trade dress reproduzido indevidamente não deixam de ser reparados.

O escritório Marcos Martins Advogados está habilitado e à disposição para tratar de questões e tirar dúvidas a respeito de trade dress e as formas de sua proteção.

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1 SOARES, José Carlos Tinoco. “Concorrência desleal” VS. “Trade Dress” e/ou “Conjunto-Imagem”. São Paulo: Ed. Do Autor, 2004, p.209.
2 TEIXEIRA, Cassiano Ricardo Golos. Concorrência Desleal: Trade Dress. Revista Eletrônica do IBPI. Revel – Nr. 1, 2009, p. 08
3 Apelação nº 0102825-96.2012.8.26.0100, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, 31/10/2017.
4 Art. 5º, CF/88: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXIX – a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País.
5 Agravo de Instrumento nº. 2045767-76.2013.8.26.0000, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, 16/06/2014.
6 Apelação nº 0004984-09.2014.8.26.0108, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, 01/11/2017.
7 ANDRADE, Gustavo Piva. O trade dress e a proteção da identidade visual de produtos e serviços. Revista da ABPI, Rio de Janeiro, n. 112, maio/jun. 2011, p. 07.
8 Lei nº 9.279, de14 de maio de 1996.
9 SOARES, José Carlos Tinoco. “Concorrência desleal” VS. “Trade Dress” e/ou “Conjunto-Imagem”. São Paulo: Ed. Do Autor, 2004, pg. 196

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