SUSPENSÃO DE AÇÕES E EXECUÇÕES TAMBÉM CONTRA OS COOBRIGADOS E AVALISTAS DE EMPRESA RECUPERANDA: A INTERPRETAÇÃO QUE DEVE SER DADA À LEI 11.101/2005

Caroline Borges Pantoja
Advogada do Escritório Marcos Martins Advogados

O pedido de recuperação judicial formulado por empresa em grave crise financeira perante o Poder Judiciário, com embasamento na Lei 11.101/2005, tem o objetivo principal a obtenção de um socorro do Estado, visando o soerguimento da sociedade em crise, no mercado, a fim de dar continuidade a atividade econômica exercida, bem como conceder a recuperanda prazo para apresentar proposta de pagamento de seus credores.

O instituto ampara empresas que, em que pese estar em cenário financeiro crítico, ainda tem sua atividade considerada viável no mercado.

Recepcionado o pedido recuperacional, o juiz analisará os requisitos de admissibilidade, oportunidade em que, se presentes, será DEFERIDO o processamento da recuperação judicial, nos termos do artigo 6º da Lei de Recuperação Judicial e Falência nº 11.101/2005, determinando a suspensão de todas as ações e execuções movidas contra a devedora principal e seus sócios solidários pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, nos seguintes termos:

  • Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.
  • (…)

Seguindo raciocínio desse artigo, incoerente que o patrimônio dos avalistas seja atingido por dívidas da devedora principal enquanto a sociedade se encontrar em recuperação judicial, e, especialmente, no período de stay de 180 dias.

Em que pese a previsão contida nos artigos 899 do Código Civil que preconiza que o avalista se equipara àquele cujo nome indicar e o artigo 49, §1º da Lei 11.101/2005 que dispõe que “os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso”, é extremamente importante saber o momento de utilizar tais medidas.

Quanto a isso, pontua-se: para viabilizar a recuperação judicial da empresa pleiteante, o legislador permitiu o estabelecimento de condições e prazos especiais de pagamento, oportunizando a empresa condições mínimas necessárias à manutenção de suas atividades ao mesmo tempo que cumpre com suas obrigações comerciais.

Nesse sentido, permitir que as dívidas sejam exigidas de terceiros garantidores é, no mínimo incoerente, de modo que na prática, de um lado concede o benefício legal e, de outro lado, retira o mesmo “benefício”, não permitindo que a devedora e seus gestores, por exemplo, tenham o “fôlego” pretendido e criado pela lei.

A visão que se deve ter é que a recuperação judicial é um instituto focalizado na recomposição econômico-financeiro de modo global que, envolve todas as obrigações constituídas tanto com os devedores principais quanto com os garantidores, tais como fiadores, avalistas, coobrigados etc.

Portanto, uma vez aprovado e homologado o plano de recuperação judicial, ao qual acarreta na novação das dívidas, não há que se falar em execuções individuais contra garantidores, posto que as obrigações oriundas dessas relações jurídicas serão estritamente cumpridas nos termos do plano de recuperação judicial, sob pena de, não o fazendo, convolar em falência e ainda, ter as garantias prontamente executadas.

Conclui-se então que, o artigo 49, §1º da Lei 11.101/2005 somente tem aplicação se o plano de recuperação judicial não for cumprido.

Neste sentido, em que pese a controvérsia que rege o tema, com entendimentos em sentido diverso já manifestados por diversos Tribunais, inclusive o STJ, traz alento a recente interpretação manifestada pelo Desembargador Federal Dr. Wilson Zauhy do Tribunal Regional Federal da 3ª Região – São Paulo que, em sede de agravo de instrumento interposto por empresa recuperanda, concedeu efeito suspensivo ao recurso determinando a suspensão da execução em face dos avalistas[1], nos seguintes termos:

  • Cabe lembrar, no entanto, que para a viabilização da recuperação judicial o legislador permitiu a adoção de condições e prazos especiais de pagamento, criando à empresa as condições mínimas necessárias à manutenção de suas atividades ao mesmo tempo em que cumpre com suas obrigações comerciais.
  • A exegese de que o benefício da recuperação judicial se estende aos avalistas baseia-se em interpretação finalística e sistemática do ordenamento que regula essa espécie de favor legal.
  • Sob a ótima finalística, pouco sentido teria o reconhecimento da pertinência da recuperação judicial, comprovação do plano de pagamento, etc. e, de outro giro, permitir que a mesma dívida seja exigida de terceiros garantidores que, ao fim e ao cabo, satisfazendo a dívida, poderão exigi-la, por inteiro, da empresa em recuperação judicial.
  • (…)
  • Assim, cumpridas as condições estabelecidas pelo referido plano e homologadas pelo Poder Judiciário, não se afigura possível que o patrimônio dos agravados/avalistas seja atingido para satisfação do débito da empresa executada sujeita a recuperação judicial, salvo na hipótese de seu descumprimento.
  • Ante o exposto, defiro o pedido de efeito suspensivo para determinar a suspensão da execução de origem. (g.n.).

Ou seja, traçar um raciocínio levando em consideração todas as vertentes que circundam uma recuperação judicial é dar à lei interpretação sistêmica e universal para a qual foi criada. O instituto nasceu com o escopo de proporcionar: (i) a superação de uma crise econômico-financeira; (ii) a manutenção da fonte produtora; (iii) dos empregos; (iv) a contribuição direta e indireta para o fomento da economia daquela localidade e do país. De modo que, permitir o prosseguimento de execuções individuais contra garantidores é na verdade retirar a vigência da lei e anular sua aplicabilidade.

Em outras palavras, de fato deve haver a preservação da empresa, da função social que exerce e o estímulo a atividade econômica – artigo 47 da Lei 11.101/2005.

Qualquer entendimento priorizando o credor ou a execução individual em detrimento do concurso de credores da recuperação judicial, vai de encontro com a finalidade da lei. É uma espécie de sacrifício coletivo, no qual, sacrifica-se certo tempo, para assegurar que todos os débitos devidos serão quitados nos prazos ajustados e aprovados pelos credores e a empresa será restabelecida no mercado financeiramente saudável.

Nessa perspectiva é que o escritório Marcos Martins Advogados ganha destaque em seus petitórios, posto que atua fortemente nas diversas instâncias judiciais a fim de que prevaleça a correta aplicação da Lei nº 11.101/2005 que regula o processo de recuperação judicial e falência, preservando-se o patrimônio dos coobrigados.


[1] TRF3 – Agravo de Instrumento (202) nº 5011394-30.2019.4.03.0000 – Relator: Gab. 02 – Des. Fed. Wilson Zauhy.

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