Fábio Bernardo
Advogado do Escritório Marcos Martins Advogados
Este texto é direcionado para as empresas que são tributadas pelo lucro presumido, e, nessa condição, possuem uma oportunidade de adequação da carga tributária para o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica – IRPJ e a Contribuição Social sobre o Lucro líquido – CSLL.
O Supremo Tribunal Federal, em março de 2017, ao concluir o julgamento do Recurso Extraordinário nº 574.706/PR[1], entendeu que o ICMS não deve ser incluído na base de cálculo do PIS e da COFINS.
Esse entendimento acabou por criar uma série de oportunidades de redução da carga tributária para os contribuintes, inclusive reabrindo discussões que pareciam pacificadas em favor do fisco.
A título exemplificativo, os Tribunais vêm excluindo o imposto sobre serviços de qualquer natureza – ISSQN da base de cálculo do PIS e da COFINS e, no início deste mês, a primeira Seção do STJ definiu que o ICMS também não deve ser incluído na base de cálculo da contribuição previdenciária sobre a receita bruta – CPRB.
Nesse contexto, o que esse breve artigo pretende abordar são as implicações desse entendimento no cálculo do IRPJ e da CSLL, apurados na sistemática do lucro presumido.
Inicialmente, deve-se mencionar que no acórdão proferido pelo STF relativo ao PIS e à COFINS, ficou definido que o ICMS, imposto estatual que está embutido no preço das mercadorias vendidas pelas empresas, não pode ser classificado como receita, visto que ele apenas é recebido pelo contribuinte e repassado ao fisco estadual.
É sabido que no nosso sistema tributário diversos são os impostos e contribuições que se utilizam, direta ou indiretamente, da receita auferida como base de cálculo para sua incidência.
É o que o ocorre com o IRPJ e a CSLL calculados na sistemática do lucro presumido.
De acordo com o artigo 25, inciso I da Lei nº 9.430/96, a principal porção do lucro presumido é a resultante da aplicação de percentuais definidos em lei sobre a receita bruta do contribuinte:
- Art. 25. O lucro presumido será o montante determinado pela soma das seguintes parcelas:
- I – o valor resultante da aplicação dos percentuais de que trata o art. 15 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, sobre a receita bruta definida pela art. 12 do Decreto-Lei nº 1.598, de 26 de dezembro de 1977, auferida no período de apuração de que trata o art. 1o, deduzida das evoluções e vendas canceladas e dos descontos incondicionais concedidos; e (Redação dada pela Lei nº 12.973, de 2014)
Assim, o entendimento proferido pelo STF no julgamento do PIS e da COFINS é perfeitamente aplicável ao cálculo do IRPJ e da CSLL pelo lucro presumido.
Se o ICMS não é receita para fins de apuração do PIS e da COFINS, ele também não será receita para apuração da base de cálculo do IRPJ da CSLL na sistemática do lucro presumido, visto que o imposto estadual, como já mencionado, apenas é recebido pelo contribuinte e repassado ao estado.
O artigo 110 do CTN é claro no sentido de que a legislação tributária não pode alterar o conteúdo e o conceito dos institutos de direito privado, não fazendo sentido haver distinção entre o conceito de receita bruta para apuração de tributos distintos.
Em outras palavras, o conceito de receita bruta para apuração do PIS e da COFINS definido pela corte suprema, deve ser estendido a todos os tributos que utilizem essa grandeza em sua base de cálculo, sob pena de uma total insegurança jurídica.
Essa discussão estava praticamente pacificada pelo STJ em sentido contrário ao contribuinte, mas desde o julgamento ocorrido em março de 2017 no STF ela foi reacendida.
Embora ainda haja resistência por parte de alguns tribunais, contribuintes têm conseguido decisões favoráveis no judiciário para excluir o ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL no lucro presumido, conforme se exemplifica pelo julgado abaixo transcrito, do Tribunal Regional Federal da 4º Região:
- TRIBUTÁRIO. IRPJ E CSLL. INCLUSÃO DO ICMS NA BASE DE CÁLCULO. COMPENSAÇÃO. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. O Plenário do STF, no julgamento do Recurso Extraordinário 574706, com repercussão geral reconhecida, entendeu que o valor arrecadado a título de ICMS não se incorpora ao patrimônio do contribuinte, representando apenas ingresso de caixa ou trânsito contábil a ser totalmente repassado ao fisco estadual. Não se tratando de receita bruta, os valores recolhidos a título de ICMS não compõem a base de cálculo do IRPJ e da CSLL. […] (TRF4, AC 5018422-58.2016.404.7200, Primeira Turma, Relator Jorge Antonio Maurique, juntado aos autos em 12/05/2017).
Diante desse cenário, o próprio STJ resolveu rediscutir essa questão. Os Ministros da Primeira Seção daquele tribunal, no mês de março deste ano, afetaram os Recursos Especiais nº 1.767.631 – SC, 1.772.634/RS e 1.772.470/RS à sistemática dos recursos repetitivos, e decidirão, de forma definitiva, se o ICMS pode ser excluído da receita bruta para fins de apuração do IRPJ e da CSLL no lucro presumido.
Tendo em vista à necessidade de coerência no sistema jurídico, espera-se que a Corte Superior reja seu posicionamento, alinhando-o com a jurisprudência do STF, como já ocorreu em outras oportunidades.
Diante desse cenário, cabe ao contribuinte interessado ajuizar
ação visando o reconhecimento desse direito, reduzindo sua carga tributária e
levantando créditos decorrentes dos pagamentos indevidos, lembrando que podem
ser restituídos os tributos pagos nos últimos 5 anos.
[1] BRASIL. Supremo Tribunal Federal, Recurso Extraordinário nº 574.706/PR, Relª Min. Carmem Lúcia, DJe-223, Brasília, 29.09.2017.