Devolução em dobro por cobrança indevida exige comprovação da má-fé do devedor

Camila Vieira Guimarães 
Tatiane Bagagí Faria 
Advogadas do Escritório Marcos Martins Advogados 

Nos termos do art. 42 do CDC, o consumidor que for cobrado por quantia indevida terá direito a receber o dobro do valor pago em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, exceto hipótese de engano justificável.

O ordenamento jurídico brasileiro prevê no Código de Defesa do Consumidor (CDC) e no Código Civil a aplicação de penalidade aquele que cobrar dívida de forma indevida.

Importante destacar que, na relação de consumo, para que o devedor faça jus ao recebimento em dobro, exige-se que ele tenha de fato efetuado pagamento do valor indevido, como, por exemplo, pagamento de boletos enviados pelo credor em duplicidade, referentes à mesma cobrança.

Já o art. 940 do Código Civil dispõe que, quando o credor cobrar dívida já paga, total ou parcialmente, estará obrigado a pagar ao devedor o dobro do que houver cobrado e quando cobrar mais do que for devido estará obrigado a pagar ao devedor o equivalente do que dele exigir a mais.

O legislador quis proteger o devedor de abuso de cobrança por parte dos credores nas relações de natureza civil, como por exemplo, partes que se relacionam mediante contrato de prestação de serviços.

O Superior Tribunal de Justiça entende ainda que o devedor só terá direito ao dobro do que foi erroneamente cobrado caso o credor efetue a cobrança mediante processo judicial. Contudo, há controvérsia sobre a necessidade de comprovação de má-fé do credor para ser devido o pagamento em dobro, seja na relação de natureza consumo, seja na relação civil.

Na esfera consumerista, tal tema é inclusive objeto de incidente de resolução de demandas repetitivas. A 1ª e 2ª Seções do STJ possuem entendimentos divergentes a respeito da aplicação deste dispositivo, quanto à exigência de comprovação de má-fé de quem efetuou a cobrança para que o consumidor tenha direito ao que pagou indevidamente em dobro. Em razão do volume de ações com esta mesma matéria, o STJ afetou este tema, cadastrado sob o n.º 929, havendo expectativa de eu seja julgado ainda em 2020.

Na esfera cível, o STJ em várias decisões posicionou-se no sentido de exigir a má-fé do credor que ajuíza demanda judicial indevidamente em face do devedor.

A orientação desta Corte Superior e da doutrina especializada é pacífica no sentido de que o artigo 940 do CC apenas pode ser aplicado quando (i) a cobrança se der por meio judicial e (ii) a má-fé do demandante ficar comprovada. Assim, são pressupostos indispensáveis para a caracterização do ressarcimento ao dobro.

Por tal razão, não basta apenas a cobrança em duplicidade, que pode ser extrajudicial e decorrente de erro justificável, pois haveria uma banalização do instituto. Contudo, havendo a comprovação da má-fé, consistente na tentativa de obtenção de vantagem indevida, e cobrança judicial, que movimenta a máquina judiciária e traz ainda maiores transtornos ao suposto devedor, a jurisprudência, em consonância com a legislação, entendeu por bem determinar o ressarcimento em dobro.

Logo, caso ocorra a situação de cobrança judicial por dívida já paga, comprovada a má-fé do credor, o devedor passa a ter o direito da repetição do indébito, com início do prazo prescricional na data em que ocorreu a lesão, ou seja, a data do efetivo pagamento. Assim, para propositura da ação, o devedor deve ter a presença de três requisitos: (i) existência de prestação indevida; (ii) natureza de pagamento do ato e (iii) má fé do credor da cobrança em duplicidade.

Ocorrendo tal situação, haverá, conforme entendimento jurisprudencial recente, o instituto da repetição do indébito.

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