Alienação fiduciária e a busca e apreensão de bens

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Cintia Solé
Advogada do Escritório Marcos Martins Advogados

O plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, deliberou em recente julgado pela legitimidade da realização de busca e apreensão sobre os bens alienados fiduciariamente, elucidando a controvérsia jurídica que pairava acerca da constitucionalidade do artigo 3º do Decreto-Lei nº 911 de 1969.

Isto porque, tendo em vista a admissão de realização da busca e apreensão de bem dado em garantia fiduciária em caso de inadimplemento do devedor, com a consequente promoção dos atos de venda do bem para liquidar saldo credor, se debatia sobre sua possível afronta ao princípio do devido processo legal, e recepção pela Carta Magna haja vista sua promulgação anteriormente ao vigor da Constituição Federal de 1988.

O pleito inicial da demanda objeto da decisão versou sobre ação de busca e apreensão proposta pelo Banco recorrente em face da devedora recorrida em razão do inadimplemento de parcelas de financiamento de um veículo dado em garantia fiduciária.

Foi proferido acórdão pelo Tribunal de Alçada de Minas Gerais extinguindo a demanda sob o entendimento de que o Decreto-Lei nº 911 de 1969 estaria em desacordo com determinado pelos princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa previstos na Constituição Federal de 1988.

No Recurso Extraordinário RE 382928/MG, o recorrido ressaltou o acerto da decisão combatida, ao passo que o recorrente aduziu que a ausência de propriedade do devedor fiduciante sobre o bem ofertado em garantia -restando-lhe somente a posse direta, implicaria na busca e apreensão sobre o veículo para o fim de possibilitar que o credor retomasse sua posse, fator considerado pelo julgador quando da concessão da liminar de busca e apreensão que restou devidamente cumprida.

Em voto vencido, o Ministro Relator Marco Aurélio, aduziu pelo acerto da decisão proferida no agravo de instrumento, votando pelo desprovimento do Recurso Extraordinário por compreender que haveria incompatibilidade entre o referido Decreto-Lei e a Constituição Federal.

De mesmo modo, o Ministro Edson Fachin, em minoria, votou pelo desprovimento recursal e manutenção da extinção do feito em decorrência da “falta de lastro jurídico da medida liminar de busca e apreensão, nos moldes em que estabelecida pelo Decreto-lei 911/1969, antes da Lei 13.043/2014.”

Os votos vencidos foram então acompanhados pelos Ministros Ricardo Lewandowski e Rosa Weber.

Já o Ministro Alexandre de Moraes, por sua vez, proferiu o voto vencedor, o qual foi acompanhado pelo Ministro Gilmar Mendes e demais ministros, deliberando pelo provimento ao Recurso para afastar a extinção do processo, determinando prosseguimento do seu julgamento no tribunal de origem.

Isto porque, conforme seu entendimento, o acórdão guerreado diverge tanto do entendimento do Superior Tribunal de Justiça –“guardião das normas infraconstitucionais”-, quanto do entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, o qual determinou que o Decreto-Lei nº 911 de 1969 havia sido recepcionado pela Constituição de 1988, precedente, este, aplicado em julgamento ao RE 599698, ao ARE 910574 e outros recursos.

Outrossim, o Ministro Alexandre de Moraes ressaltou ainda que o texto do decreto citado foi alterado pelas Leis nº 10.931/2004 e nº 13.043/2014, corroborando sua recepção pela Carta Magna e outorgando maior efetividade e agilidade à garantia fiduciária, ao passo que incentiva a operação garantida, diferindo o contraditório para momento posterior ao ato de constrição.

Asseverou ainda que, independente de contraditório, é plenamente possível que haja concessão de medida liminar de busca e apreensão ao veículo dado em garantia, consolidando a propriedade e posse do credor fiduciário após 5 (cinco) dias do seu cumprimento.

Neste sentido, proferiu seu voto pelo provimento, e, apesar de o recurso extraordinário não estar submetido à repercussão geral, se dispôs ainda a propor uma tese de julgamento visando conceder maior objetividade ao precedente, nos termos:

“O art. 3º do Decreto-Lei nº 911/69 foi recepcionado pela Constituição Federal, sendo igualmente válidas as sucessivas alterações efetuadas no dispositivo”.

Desse modo, a Suprema Corte reconheceu a constitucionalidade do Decreto-Lei 911 de 1969, especialmente no que tange ao seu artigo 3º e admissibilidade da busca e apreensão em bens alienados fiduciariamente.

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