A ALIENAÇÃO DE ATIVOS NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE EMPRESAS – UNIDADE PRODUTIVA ISOLADA

Nathália Guedes Brum

Advogada do escritório Marcos Martins Advogados

Com o atual cenário econômico nacional, está cada vez maior o número de empresas que ingressam com pedido de recuperação judicial no Brasil, conforme se observa no Indicador Serasa Experian de Falências e Recuperações[1].

A Lei nº 11.101 de 09 de fevereiro de 2005 – Lei de Falências e Recuperação de Empresa (doravante “LFRE”), que regula a matéria, prevê várias alternativas a serem adotadas pela empresa para a superação da crise, dentre elas, a possibilidade de venda judicial de filiais ou de Unidades Produtivas Isoladas (UPI) do devedor, que tem se mostrado bastante atrativa.

Isto porque, as empresas normalmente possuem em sua estrutura, ativos mal geridos e/ou pouco rentáveis e, através da alienação de UPI, é possível transformá-los em receita para prosseguimento de suas atividades empresariais e pagamento dos credores da recuperação judicial.

Embora seja possível, como meio de recuperação judicial, a alienação de outros ativos isoladamente, o diferencial no caso da alienação de UPI é que o adquirente pode desenvolver ou prosseguir com as atividades empresariais livre de qualquer ônus e da sucessão dos passivos existentes no estabelecimento anterior, conforme consta do artigo 60 da LFRE:

Art. 60. Se o plano de recuperação judicial aprovado envolver alienação judicial de filiais ou de unidades produtivas isoladas do devedor, o juiz ordenará a sua realização, observado o disposto no art. 142 desta Lei.

Parágrafo único. O objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, observado o disposto no § 1o do art. 141 desta Lei.

A inexistência de sucessão quanto às obrigações passadas torna mais atrativa a venda da UPI, o que tende a aumentar do número de compradores interessados, bem como o valor de venda desses ativos.

Isto porque, em condições normais, quando uma sociedade empresária adquire outra, ela herda todo o passivo trabalhista e tributário do estabelecimento adquirido[2] e, no caso de uma empresa em situação recuperacional, a negociação ficaria bastante prejudicada.

Especificamente com relação ao passivo tributário, houve alteração no artigo 133 do CTN, por intermédio da Lei Complementar 118 de 09 de fevereiro de 2005, que inseriu os parágrafos primeiro, segundo e terceiro, os quais dispõem sobre a ausência de sucessão fiscal pelo adquirente de filial ou UPI em processo de recuperação judicial, o que confere ainda mais segurança jurídica ao negócio.

Quanto ao passivo trabalhista, inicialmente havia divergência de entendimento quanto à ausência de sucessão na recuperação judicial, mas o Supremo Tribunal Federal pacificou a questão com o julgamento da ADI 3.934/DF[3] e do RE 583.955-9[4], ambos de relatoria do Ministro Ricardo Lewandoswski, declarando que não são inconstitucionais os artigos da LFRE que estabelecem a ausência de sucessão trabalhista pela alienação de UPI na recuperação judicial e na falência.

Com isso, a jurisprudência trabalhista se firmou no sentido de que a alienação de empresa em processo de recuperação judicial não torna o adquirente sucessor do passivo trabalhista, afastando a responsabilidade solidária deste nas obrigações oriundas dos contratos de trabalho anteriores.

Neste caso, a LFRE estabelece que os empregados do devedor que forem contratados pelo adquirente da UPI serão admitidos por novos contratos de trabalho[5].

A fim de não permitir que a alienação de UPI seja utilizada para fins ilícitos, a LFRE estabelece que haverá sucessão quando o arrematante for sócio da sociedade recuperanda ou falida ou em sociedade por ela controlada; parente em linha reta ou colateral até o 4o grau, consanguíneo ou afim,; ou identificado como agente do falido com o objetivo de fraudar a sucessão[6].

Para evitar emptio a non domini, o legislador estabeleceu que se algum dos bens que integram a UPI estiver gravado com ônus real, o credor titular da garantia deverá concordar expressamente com a supressão ou substituição da garantia, antes da alienação [7].

Nos termos do já mencionado artigo 60 da LFRE, é necessário que haja previsão da alienação de UPI no Plano de Recuperação Judicial, o que também pode ser feito posteriormente por meio de aditamento, a fim de que os credores sejam informados sobre sua possível alienação, sua composição e a forma de utilização dos valores obtidos com a venda.

Para que a alienação da UPI possa ser efetivada, o Plano deve ser aprovado pelos credores na Assembleia Geral. Muitas vezes também é necessária uma nova Assembleia para aprovação específica da proposta de alienação dos ativos pelos credores, cujo procedimento, propriamente dito, pode ser realizado através de leilão judicial ou por meio de propostas fechadas.

Por tais razões, a alienação de ativos por meio da venda de Unidades Produtivas Isoladas, é uma das mais eficientes e seguras formas de captação de recursos para a empresa recuperanda, pois, além de ser revestida de segurança jurídica, permite a obtenção de receita para a empresa em crise adimplir seus débitos e capitalizar sua operação, atingindo, deste modo, o objetivo do legislador que é a preservação dos postos de trabalho e da atividade empresarial.



[1] SERASA. Indicador Serasa Experian de falências e recuperações. Disponível em: <http://www.serasaexperian.com.br/release/indicadores/falencias_concordatas.htm>. Acesso em: 02.02.2016
[2] Conforme disposto nos artigos 10 e 448 da CLT, artigo 133 do CTN e artigo 1.146 do Código Civil.
[3] STF – ADI 3934/DF – Ação Direta de Inconstitucionalidade, Relator: Min. Ricardo Lewandowski, Julgamento: 27.05.2009, Órgão Julgador: Tribunal Pleno.
[4] STF – RE: 583.955-9, Relator: Ministro Ricardo Lewandoswski, Julgamento: 28.5.2009, Órgão Julgador: Tribunal Pleno.
[5] Artigo 141, § 2o da LFRE.
[6] Artigo 141, § 1o da LFRE.
[7] Artigo 50, § 1o da LFRE.

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